Essa é minha história. Não importa para mim se irá ou não acreditar nela. Também não me importo com qualquer outra coisa. Peço-lhe, apenas leia.

Cinco. (Dedicado à Marcella)

   Quinze anos. Eu já me comportava como um garoto de dezenove, e era alto como um; era sério, preferia dialogar com pessoas adultas, usava roupas formais e meu modos eram impecáveis, como sempre. E é aí que minha história realmente começa.
   Eram aproximadamente nove horas da noite; eu voltava da casa de um ancião, que visitava com frequência. Não, não pense em caso de gerontofilia. Apenas gostava de escutar suas histórias, enquanto ele me servia um chá aguado, que eu aceitava por educação. Ele me admirava e precisava de mim, e eu lhe prestava este serviço, com muito interesse por seus casos de juventude, e seus conselhos absurdamente sábios. Mas estou fugindo do foco; vamos voltar ao que interessa.
   Como eu disse, estava voltando de sua casa, pela rua das Glacínias, quando fui abordado.
   Na época, a rua das Glacínias era morada de novos lotes, casas em construção e becos de fumo; em muitos pontos as lâmpadas dos postes estavam quebradas e os fios elétricos haviam sido roubados, transformando-a em um lugar com pouquíssima luz.
   Eu era uma criatura totalmente contrastante com o cenário. Nunca poderei esquecer: eu estava usando calças negras de veludo fino, camisa de algodão branca com punhos de renda e um casaco grosso, também negro. Na época, tinha cabelos que caiam pelos ombros, que estavam cuidadosamente penteados para trás. Parecia com um garoto de décadas passadas, porém não me importava; era assim que gostava de me vestir.
   Então fui abordado, uma mistura de falta de atenção e olhar distante da minha parte e rapidez e boa esgueira da parte do abordador. Quando voltei a olhar para frente ele estava ali, parado, olhando para mim com um sorriso malicioso e belo, como se estivesse ali há muitos minutos. Não consegui impedir, trombei com ele; porém, ele não pareceu se importar, e nem ao menos ameaçou perder o equilíbrio.
   Me desculpei e tentei me afastar, porém ele me segurava. Disse com uma voz rouca, porém doce, que não havia problema algum, enquanto fechava os braços ao meu redor - sua força era incrível. Tentei me desvencilhar, assustado, porém era impossível.
   - Você é um belo garoto, sabia? - Ele sussurrou ao meu ouvido. Meu rosto estava contra seu pescoço, e eu sentia o cheiro amadeirado de sua colônia. Tudo estava confuso; eu estava com muito medo, paralisado, mas também sentia uma excitação estranha ao sentir seus braços de força incrível ao redor de meu corpo. - Não tema, meu belo anjo... Não irei matá-lo, apenas farei o necessário... - continuou ele.
   Então, para aumentar meu medo, ele retirou uma faca muito limpa e afiada do cós de sua calça. Eu tentava com mais força me desvencilhar, mas era inútil.
   Ele tirou o casaco de um dos meus braços, com gentileza, e me cortou, acima do ombro. Eu não estava acostumado a sentir dor, porém toda a estranheza da cena me impediu de dar importância à isso. Ele sorriu, mostrando seus perfeitos e brancos dentes, aproximou os lábios do corte e tomou o primeiro gole.
   Veio-me uma sensação forte, nauseante, incrível. Eu já não tentava impedi-lo, na verdade, me entreguei totalmente. Meus olhos se fecharam e eu soltei meu peso em seus braços, que me seguravam com carinho. Eu sentia e ouvia o sangue fluindo, e os nossos corações, como se fossem tambores. Era como a sensação anterior ao orgasmo; era perfeito.
   Rápido, muito mais rápido que eu desejava, fui trazido de volta à consciência. Ele se afastara de meu braço, me segurando com pouca força, e seu rosto parecia arder de glória; arrumou meus cabelos para trás, beijou meus lábios e se afastou, correndo à toda velocidade, por um caminho escuro e confuso em meio a paredes não terminadas e materiais para construção. Eu estava paralisado olhando-o se afastar, atordoado demais para fazer coisa alguma.

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