Essa é minha história. Não importa para mim se irá ou não acreditar nela. Também não me importo com qualquer outra coisa. Peço-lhe, apenas leia.

Dois.

   Os anos se passaram. Fui criado por um tio paterno, que vou chamar carinhosamente de Mario. Um homem extremamente generoso e que sempre foi muito bondoso comigo, e me proporcionou um infância invejável em muitos aspectos, apesar dos problemas que tive com a data do Natal - mas vamos deixar essa parte da história para algumas linhas abaixo.
   Mario era viúvo, e para mim sempre terá quarenta e seis anos. Não tinha filhos, mulher, homem ou bicho de estimação. Era inteiramente meu.
   Vivíamos em uma bela casa, espaçosa, inteiramente em tons de azul e branco, por dentro e por fora. Era repleta dos mais modernos aparelhos eletronicos, porém mesmo assim tinha um confortável ar rústico, com sofás e prateleiras de alvenaria, além de gordas almofadas e pufes por todos os lados. As cortinas eram de veludo, alguns cômodos tinham o chão revestido com carpete, e havia um belíssimo lustre de cristais no saguão de entrada. Tudo do mais impecável gosto. Isso sem falar nas peças artísticas! Sim, Mario tinha uma considerável coleção de quadros e esculturas em estilo clássico, a grande maioria de anjos e paraísos.
   Ah sim, passaremos ao que eu mencionei anteriormente - o Natal. Nunca fui, quando criança, apresentado à religião alguma. Meu querido tio não se importava com Deus, Diabo, bem, mal, morte, inferno, paraíso, espíritos, rituais, orações ou Jesus. Natal, Páscoa, e qualquer outro feriado cristão era, para ele, apenas um dia de folga.
   Porém, eu via coisas sobre o Natal que me intrigavam. Filmes natalinos, neve, luzes bonitas, árvores com bolas coloridas, presentes, Papai Noel, ceias, família. Por que eu não tinha nada daquilo, e nunca tive? Perguntei essas coisas ao meu tio, quando tinha oito anos de idade. Ele pareceu vacilar por um momento, antes de me explicar:
   -Me perdoe, meu querido, por não ter lhe explicado antes. Como você provavelmente deve ter visto em algum lugar, Natal é a celebração do nascimento de Jesus. Porém, isso nada significa para mim, e torço para que nada signifique para você. Jesus é uma lenda, um homem com supostos poderes, como aqueles super-heróis que você vê nos seus filmes. Isso não deve nos afetar, meu doce. Devemos ter olhos e mentes voltadas para a razão, devemos ser admiráveis homens do século XX!
   Toda essa explicação de nada significou para mim. Eu, como a maioria das pessoas no tempo moderno, não me importava com Jesus; e sim com os presentes e a comida. Mas, sem outra escolha, restou à mim aceitar.

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